segunda-feira, 29 de julho de 2013

[des]cabimento;


Da aproximação ao silêncio constrangedor entre duas pessoas, o que cabe no vão que se faz entre a fala que nos falta ?

 Couberam meus olhos fechados contra as luzes dos carros, que formavam com os faróis desenhos em minhas pálpebras, a preocupação com a bolsa sobre a mesa, desatino tão meu quanto a sua atenção exagerada ao ato despercebido. 

Couberam as mãos inquietas, dois copos, cinco garrafas. Coube a sua camisa de algum time estrangeiro de futebol. Chile?  Não cabe contabilizar o tempo, o país, o brasão ou a cor. Vermelha? Não, me recordo muitíssimo bem de ser azul... ou branca. Sua tatuagem eu não esqueço, no braço direito ou esquerdo está escrito coragem. Enquanto eu relia de olhos fechados, meu peito gritava: Covardia!

Quantas coisas mais, cabem no espaço vazio dos meus olhos calados?

 Cabia a moça vendedora de amor da esquina, a música do bar que confesso, não me recordo um acorde por ter em mim cabido mais copos de cerveja do que os que cabiam sobre a mesa.

Couberam algumas lembranças, das mais próximas até as mais distantes. Do metrô até ali, do ali até a mesa, da conversa, seu sorriso, nossos risos, a barata voadora, meu grito, teu silêncio... ah, o silêncio!

 Nós sabemos muito bem o que cabe no silêncio, nós. Os da minha cabeça, do meu cabelo, nossos dedos, bocas e devaneios. Nós. 

quarta-feira, 24 de julho de 2013

Singular;

     Pela brecha da janela entreaberta entra sorrateira e fria uma brisa de lembranças gélidas. Qualquer  lembrança tem remetente. Você, ele, os outros.  Valha o esforço, o fim é sempre o mesmo.  Roupas espalhadas  no chão, corpos separados pela vida, mentes separadas pela ideia de ensaiar as palavras.



- Está tarde, preciso ir.
- Não pode ficar um pouco mais?
- Ficar para quê?
- Não sei...
- Nunca sabe. Vou indo.
- Te levo até o ponto!

     
     Levanta, veste as roupas tão frias quanto veste as palavras. Caminha tão somente no próprio caminhar  como quem se desloca pelo espaço sem rumo. Acompanha como quem leva nada além de solidão. Despede-se e promete se fazer  presente novamente, mesmo sabendo que já ali não está. Jamais esteve. 

quinta-feira, 2 de maio de 2013

"Tudo tem seu tempo"


   Tempo, tempo, tempo. Tem música, tem verso, poema, passagem na Bíblia, filosofia, citação do Ghandi e se bobear tem pichação também. Só pra medir o tamanho do questionamento. Todos dizem "deixa o tempo resolver", "só o tempo cura", enfim, o tempo é o segredo.
Mas cansa entregar pro tempo, achar que ele é uma espécie de matéria milagrosa. Tempo seu é você quem faz (me engano em terceira pessoa, acho bonito desmaterializar o eu).
Eu. Ego, superego, id. Isso. Personalidades de formas físicas, psíquicas, espirituais agora... e o tempo nisso? É que levou tempo pra eu cair num abismo chamado eu.
Pronta e no tempo, eu caí. Enfim entendi, eu preciso ter fé, nem que seja em algo absurdo como numa imagem, ou num deus, ou numa estátua de um cara gordo que falou coisas bonitas lá na ásia. No fim a fé é em si mesmo, o "seja lá o que for" de projeção só serve pra que você consiga acreditar em algo além de você, que não se acha capaz sozinho.
É a solidão que atrai a fé. É ser pequeno que atrai um deus maior que tudo. É ser incapaz que atrai a busca da razão além da razão.
É se despedaçar para juntar parte por parte e enfim entender que o tempo existe de forma onírica.

quarta-feira, 1 de maio de 2013

Última visualização ...


     Você gosta de alguém, que gosta de outro alguém, que gosta de outro alguém; faz-se jus ao poema. O amor é um tal de guerrilhar consigo mesmo. Antigamente esperava-se a visita do ser amado, enquanto o mesmo visitava outro alguém que talvez nem quisesse visita alguma. Depois com o tempo, a visita virou um telefonema, esperado no dia seguinte  após uma bela noite, que só foi bela pra quem ficou esperando o telefone tocar. E provavelmente não tocou, provavelmente também, ele estaria tocando numa outra casa, pra outra pessoa que talvez nem quisesse telefonema algum. E hoje em dia, além dessas alternativas, temos mais umas tantas pra esperar algo que pode nunca vir. É você esperando resposta de uma mensagem visualizada há dias, enquanto deixa de responder outra, de uma outra pessoa, por estar focado na mensagem que nunca vai chegar, porque aquela pessoa talvez esteja escrevendo pra um outro alguém que talvez, não quisesse mensagem alguma.  

sábado, 13 de abril de 2013

Uma boa razão para você beber mais

     Desde muito pequenos, aprendemos a lidar com o "NÃO PODE!". E em uma certa fase da vida, essa é a frase mais dita por aqueles que nos dão a vida. É justamente nessa fase que aprendemos a lidar com as proibições, os limites. O "não poder" gera em nós desde sempre, uma angústia. Cabe então decidir conformar-se com a regra e esquecer o que se deseja em nome da paz interior, ou confrontar-se com a inquietude de buscar aquilo que por algum motivo, não está dentro dos limites de possibilidade. Tudo completamente natural para a formação da estrutura psíquica de um indivíduo, desde que, o mesmo não enxergue em sua angústia o medo da decisão em si. Confrontar-se com a tal inquietude provocada por um desejo, pode muitas vezes gerar a ideia de erro antes mesmo de dar-se a margem deste. É a partir dai que o caminho mais fácil é não pensar no que se deseja pelo medo da angústia que isso pode gerar diante da possibilidade de fracassar. Eis então o grandessíssimo papel da vodka na vida humana. 

terça-feira, 2 de abril de 2013

Agora escolha o que você quer...



     Me lembro de ouvir essa frase ainda muito pequena, enquanto minha mãe apontava uma enorme vitrine de sapatos. Quando somos crianças, vemos tudo maior e mais bonito. E me parecia uma tarefa complicada, escolher uma opção dentre tantas em meio a uma vitrine iluminada. Passavam-se longos minutos, ou mesmo horas ali sem saber o que fazer com meu direito de escolha, enquanto testava a paciência materna cedida; enfim a paciência acabava, e minha mãe me apresentava outra sensação, a de ser pressionada. 
- Não temos toda a vida pra isso, e você precisa saber o que quer.
Enfim eu tomava uma decisão, escolhia. Afinal não ter toda a vida me parecia algo sério, e precisar saber o que querer também, mesmo não tendo nenhuma consciência intelectual do que isso significava. E eu escolhia. Nunca minha escolha era alcaçável. De uma forma estranha e triste pra mim, quanto criança, nunca havia a opção que eu tomava de escolha com tanta dificuldade. 
- Não temos seu número nesse modelo; dizia a vendedora.
 Como não tinham meu número? Eu havia escolhido! A vitrine estava lá, com a opção pra que eu escolhesse. Estava ao alcance dos meus olhos, eu já havia imaginado o momento de calçar, de caminhar, de me sentir completa com aquela escolha! Mas ela não me servia, não estava disponível além do meu olhar. Eu teria de tomar outra decisão, ter uma segunda opção, o que me fazia pensar que seria infeliz, já que houve ali uma opção antecedente. Haveria um vazio pra me lembrar, que eu não teria feito aquela escolha, e sim ela teria me escolhido ?
Lá ia eu, em toda minha insignificância, escolher outro modelo de "escolha". Olhava aquele que já teria passado pelo meu olhar, mais rapidamente, não com tanta paixão. Sentia uma certa piedade de ele ser minha segunda opção. Pedia, provava, servia, sentia ser confortável. 
A decisão era tomada com um olhar de aprovação maternal, minha mão estava segura por ela. Mas ao sair da loja, eu saberia que iria olhar minha primeira escolha e lembrar que aquela não me foi disponível por não me servir. Afinal, o que ela estaria fazendo ali se dispondo pra que eu a pudesse desejar?
Talvez estivesse ali para que eu me lembrasse de que ela não me era disponível apenas por não ser. E que a escolha tomada estaria comigo em bons momentos, me daria a tal completude sem que eu percebesse. Me auxiliaria a cada passo até que enfim, pudesse obter por ela, amor. E quando enfim eu pudesse perceber tal sentimento, já estaria o sapato apertado. E eu teria então que recomeçar minha escolha por outro sapato. 

quinta-feira, 14 de março de 2013

Ser ou não ser, a depender da questão;


É compreensível que alguns atos justifiquem-se por algumas faltas. Também acho normal que as pessoas mudem. Acho incrível quem consegue chegar onde quer com leveza, quem sabe o quer com determinação. O problema é quando a qualidade deixa de ser benéfica e se torna defeito. Passa-se a ser útil para situações inúteis, deixa-se criar desconfortos. Algumas pessoas tem dons magníficos como a persuasão, a liderança, a coragem. E algumas dessas pessoas usam esses dons para jogar sujo de forma mais ousada.
É interessante ser bom jogador. Mas é mais interessante ser bom observador, afinal todos os truques humanos tem suas falhas, e as falhas ficam descritas em ações, ou falta de ações.
 É importante perceber personalidades, e perceber que algumas variam de acordo com seus interesses.
É importante sermos essência para que não nos tornemos necessidade.